domingo, 4 de dezembro de 2016

A Chegada (Spoliers)


À primeira vista o filme de Denis Villeneuve pode até parecer mais uma ficção científica hollywoodiana sobre uma invasão alienígena ao planeta terra. No entanto, o longa é muito mais do que isso, é uma obra carregada de suspense, poesia e questões filosóficas. Portanto, o filme não é indicado para quem esteja a fim de um blockbuster pipoca sobre aliens, como Independence Day e afins. A Chegada se destina aos apreciadores de uma boa ficção científica, que se baseia em conceitos científicos e filosóficos para criar uma trama interessantíssima.

O longa narra a chegada de ETs em diversas partes do mundo, e conta como os humanos entram em contato com eles para entenderem qual a real intenção dos alienígenas pousarem na terra. Para compreender os visitantes interplanetários, o exército dos EUA convoca a linguista e professora universitária Dra. Louise Banks (Amy Adams) para desvendar a língua dos aliens. Basicamente o filme todo se mantém na linguista tentando se comunicar com os ETs ao mesmo tempo em que vai compreendendo o código de linguagem dos mesmos.

O começo do filme é um pouco lento e exige a atenção do expectador. No entanto, conforme a história vai se desenvolvendo Villeneuve consegue a total atenção do público através de uma atmosfera de suspense muito bem orquestrada. O diretor se mostra mais uma vez um bom construtor de tensão e suspense que instigam a plateia, assim como já demostrou em seus trabalhos anteriores O Homem Duplicado e pincipalmente em Os Suspeitos.

Além do suspense, Villeneuve trabalha muito bem com a construção das imagens do filme (fotografia belíssima) e com a própria estrutura do roteiro. O tema central de A Chegada é a linguagem, e como ela está ligada com a cultura e com o modo de pensar dos falantes. E o interessante é que Villeneuve usa do próprio tema da linguagem na sua obra em si, através da estrutura do roteiro não linear que se relaciona com a língua dos ETs, o diretor usa a metalinguagem de forma muito inteligente.

Ainda sobre a abordagem do tema da linguagem, o filme se baseia na teoria linguística de Sapir-Whorf que resumidamente diz que o idioma e o modo de pensar estão interligados, um afeta o outro. É interessante notar que se pensarmos bem isso faz todo o sentido, visto que o sotaque, a entonação, a fonética e a escrita de uma língua dizem muito sobre o povo que a fala. Pegue o Alemão por exemplo, é um idioma que soa mais “agressivo e rude”, assim como os seus falantes que tem um modo de pensar mais rígido e disciplinado. O Italiano por sua vez é uma língua mais “cantada”, que traduz bem o caráter mais aberto e indisciplinado dos seus nativos.  Portanto, segundo a teoria de Sapir-Whorf , para aprender verdadeiramente um idioma você precisa compreender a cultura que o fala, aprender a pensar como quem o fala.

Só quando a Dra. Banks começa a compreender o modo de pensar dos alienígenas é que ela consegue entender realmente o seu idioma. No filme essa teoria é elevada até a última potência, e quando a Dra. Banks “fica fluente” no idioma extraterrestre ela passa a compreender o mundo assim como eles, ocasionando no plot twist do longa.

Apesar do plot twist ser muito bom, o filme acaba pecando um pouco justamente nele. Primeiro que para um telespectador mais atento a charada já pode ser “matada” parcialmente no meio do longa, devido as pistas que o diretor dá que deixam bem claro o que está por vir. Segundo que após revelação total do plot twist, que é muito bem-feita e emocionante, o filme tenta deixar ainda mais claro o que aconteceu, já está estaria de bom tamanho a explicação sutil, mas o diretor insiste em deixar ainda mais evidente. É um excesso que pode incomodar o expectador mais perspicaz, mas que não chega a tirar o brilho do filme.

Por fim, outro ponto que o longa exagera um pouco é no melodrama. Como dito no primeiro parágrafo o filme é bem poético, tanto nas belas imagens quanto na história em si. No entanto, há alguns momentos em que essa poesia é extrapolada para o campo do melodrama, especialmente na parte final do longa.

Quanto as atuações, as mesmas são impecáveis, ninguém fica abaixo da média. Amy Adams, como de costume dá um show, com uma interpretação ao mesmo tempo forte e contida ela carrega o filme quase que sozinha apesar do elenco de apoio também estar muito bem. Jeremy Renner e Forest Whitaker, cumprem bem o seus papeis de dar suporte a protagonista.


Por fim, A Chegada é um filme diferente do habitual. É uma obra que mescla Syfy com suspense e com uma boa reflexão filosófica. É, portanto, apesar dos seus excessos, um filme que merece ser visto, discutido e pensado. 



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