Depois de 4
temporadas e 19 episódios, pode-se afirmar que Black Mirror já é uma das
melhores séries dessa década. E como tal, é muito complicado escolher os seus 5
melhores episódios. A maior parte são de capítulos bons e excelentes e apenas
alguns pouquíssimos medianos e ruins.
O critério de
escolha foi sobretudo subjetivo, o fator principal foi o meu gosto pessoal. Mas
tentei na medida do possível levar em conta outros critérios mais objetivos,
como ritmo, roteiro, atuação, valor de entretenimento e valor intelectual.
Aliás, como a série se baseia principalmente no componente trágico e ao mesmo
tempo real da tecnologia, e também no impacto emocional que deixa nos expectadores,
esses fatores foram levados muito em consideração.
Então, vamos
lá! Confira abaixo a lista com os nossos 5 episódios preferidos:
5°
Playtest
Cooper é jovem americano que decide sair de casa para
esquecer a morte do pai que tinha Alzheimer e a consequente depressão da mãe.
Ele fica meses viajando pela Europa em um mochilão que parece que o fazem
esquecer de todos os seus problemas. Porém, o seu dinheiro começa a acabar e
ele decide servir de cobaia para um jogo de realidade aumentada em troca de um
pagamento. No entanto, a realidade do jogo se mostra extremamente crível, e os
piores medos e culpas do jovem aparecem materializados em forma de um
aterrorizante videogame que traz consequências trágicas.
Pode não ser o episódio mais original e reflexivo da série,
mas com certeza é um dos mais perturbadores e impactantes. Abordando como os
nossos piores fantasmas podem ser devastadores quando trazidos à tona.
De quebra ainda aborda a questão atual de jogos de
realidade virtual cada vez mais reais, e quais podem ser as suas possíveis
consequências.
Resumindo, é quase que um filme de terror psicológico, com
pitadas inteligentes sobre tecnologia e seus piores efeitos, como um bom
episódio de Black Mirror deve ser.
4°
Hang the DJ
Episódio da temporada mais recente da série, Hang the DJ
conta a história de um casal que se conhece através de um sistema de
relacionamentos virtuais (espécie de Tinder em realidade aumentada). Que não só
escolhe com quem a pessoa deve se encontrar, como também diz de antemão quanto
tempo o casal ficará junto. Tudo isso para, depois de vários encontros a pessoa
achar o seu “par ideal” e viver com ele o resto da vida.
No entanto, o casal de protagonistas se conhece, acaba se
apaixonando, mas o sistema diz que eles não devem ficar juntos. Depois de se
reencontrarem, eles decidem burlar o sistema e fugir de lá para viverem o seu
romance.
Além da química e carisma dos protagonistas ser muito
forte, esse episódio também apresenta uma forte reflexão sobre os
relacionamentos na era do amor virtual. A metáfora principal diz respeito a
artificialidade e o caráter descartável dos aplicativos de relacionamento, e
como eles se relacionam com a pressão que a sociedade exerce para que todo
mundo ache o seu par ideal (nesse aspecto lembra muito o filme O Lagosta do
grego Yorgos Lanthimos). Além de levantar outras questões interessantes como:
Um relacionamento já nasce tendo um prazo de validade? É necessário ter uma
experiência com vários relacionamentos fracassados para enfim achar a pessoa
certa? A tecnologia ajuda ou atrapalha um relacionamento? É possível achar a
pessoa ideal nesses aplicativos?
Enfim, é altamente reflexivo, além de ser divertido e
romântico e contar com um final memorável.
3° Nosedive
Em uma realidade onde o sucesso socioeconômico das pessoas
depende de boas avaliações dos outros, Lacie é uma garota popular que tem uma
avaliação de 4,2 estrelas de 5 possíveis. Ela está sempre preocupada com a
opinião dos outros, e como pode agradar a todos e ao mesmo tempo transparecer
ser alguém alegre, bem-sucedida e feliz.
No entanto, tudo começa a ir água abaixo quando ela acaba
se atrasando para o casamento de uma amiga de infância extremamente bem
avaliada. A demora em chegar a festa acaba irritando a sua amiga popular,
gerando avaliações negativas para Lecie, e uma pressão que ela não consegue lidar.
Levando-a se comportar de forma contrária
as convenções daquela sociedade e consequentemente fazendo a sua avaliação
despencar.
Fica claro a crítica as redes sociais, em especial ao
Facebook. A necessidade que as pessoas sentem de se mostrarem perfeitas e
felizes online, e os impactos que essa “máscara social” gera. A felicidade
virou quase que uma obrigação, e se alguém não consegue ser feliz na vida real,
pelo menos nas redes sociais existe a oportunidade de ser, ou pelo menos
parecer ser.
A interação com os outros também é importante, quanto mais
amigos e curtidas o indivíduo tiver, mais importante e bem-sucedido ele se
sente. Por mais que a pessoa não conhece pessoalmente nem metade dos seus seguidores
online, o importante é ser seguido, receber curtidas, e ser notado.
Parece que hoje em dia alguém só existe se estiver nas
redes sociais. E é justamente isso que Nosedive aborda, de forma divertida,
inteligente, pessimista e acima de tudo realista.
2° The
Entire History of you
O que você faria se pudesse acessar todas as suas memórias,
e assisti-las em sua televisão, como se fosse o seu seriado favorito?
Essa é a premissa do segundo melhor episódio de Black
Mirror. Em um mundo em que as pessoas possuem um chip implantando na cabeça que
grava e reproduz as memórias de toda a sua vida, é normal mostrar para os seus
amigos algum evento importante que aconteceu com você, como uma entrevista de
emprego, um jogo de futebol ou um encontro amoroso.
Liam e Ffion são um casal que vai jantar na casa de alguns
amigos. Nesse jantar Liam acaba desconfiando que a sua esposa o está traindo
com um amigo dela. Depois de pressioná-la para lhe contar a verdade, Liam convence
Ffion a lhe mostrar as suas memórias, e acaba confirmando a sua suspeita.A partir desse momento a relação dos dois entra em
declínio, com paranoias e desconfianças que acaba levando a consequências trágicas.
Esse é sem dúvida um dos episódios mais densos e
angustiantes de toda a série. Em tempos que cônjuges desconfiados costumam
vasculhar as redes sociais do parceiro a procura de conversas suspeitas que
comprovem uma provável traição, esse episódio é extremamente atual. E apesar dessa
tecnologia parecer distante, fica claro que se ela existisse casos como o de Liam
e Fifion seriam corriqueiros.
A reflexão que The Entire History of You traz é altamente
impactante, real e prende a respiração dos expectadores do primeiro ao último
minuto. Um verdadeiro soco no estômago, mas um soco virtual e tecnológico, bem
ao estilo Black Mirror.
1° White
Christmas
Episódio especial de Natal da segunda temporada da série, inovou
pela duração mais longa que o habitual, e também por colocar histórias paralelas
que depois se tornam uma só, ideia que foi retomada na última temporada com
Black Museum.
A história começa com dois homens conversando em uma cabana
durante uma nevasca. Matt conta a Joe sobre o tempo em que ele trabalhava como
consultor amoroso, através de uma tecnologia que permitia visualizar o que os
seus clientes estavam vendo durante uma paquera e com base nisso dar conselhos
de como eles poderiam conquistar a mulher que eles estavam conversando. No
entanto, o mundo de Matt desaba quando um dos encontros que ele dava consultoria
termina de forma trágica e ele acaba responsabilizado por isso.
Matt na verdade estava tentando obter a confissão de um
crime que Joe cometeu em troca da sua própria libertação devido a esse
incidente. Após conseguir a confissão Matt é libertado, mas não sem pagar um
preço terrível como forma de punição eterna.
Esse episódio tem uma narrativa extremamente complexa, sem
dúvida a mais elaborada de toda a série, com vários pontos de virada. Além de
contar com conceitos tecnológicos interessantíssimos como bloqueio de pessoas (inspirado
no bloqueio das redes sócias, mas ampliado para a vida real, quando a pessoa
não consegue nem enxergar e falar com quem o bloqueou), além do conceito de
transferência de consciência na nuvem, e a criação de mundos virtuais, onde
essas consciências são transportadas.
Por fim, ainda conta com uma das melhores atuações de toda
a série. O premiado ator John Hamm, vencedor do Emmy pelo seu papel em Mad Men,
interpreta Matt, um personagem com várias camadas. Sem falar no restante do
elenco que também está muito bem.
Resumindo, White Christmas é melhor episódio de Black
Mirrror por reunir de forma brilhante tudo que o seriado tem de melhor.
Reflexão, suspense, reviravoltas, impacto emocional e atuações memoráveis. Um
verdadeiro conto de terror sobre a tecnologia. Real, pessimista e muito.....
muito Black Mirror.
Como dito na introdução do texto, a tarefa de listar apenas
5 episódios dessa série tão espetacular é muito difícil. Por isso há que se
fazer uma menção honrosa a outros tantos capítulos excelente do seriado, que
poderiam perfeitamente estar nos 5+.
São eles: San Junipero, Be Right Back, Black Museum, White
Bear e Shut Up and Dance.
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