segunda-feira, 27 de junho de 2016

Mais Forte Que o Mundo: A História de José Aldo




Dirigido por Afonso Poyart (2 Coelhos) e protagonizado por José Loreto, o filme conta a história real do campeão do UFC José Aldo. Vindo de uma família pobre da periferia de Manaus, Aldo sofreu com o pai que batia na mãe, e só viu sua vida mudar quando se mudou para o Rio de Janeiro para tentar realizar o sonho se tornar um lutador profissional.
Além das boas cenas de luta o filme conta com um componente dramático muito bem trabalhado. Ao mesmo tempo em que odeia o pai violento, Aldo o admira e se identifica com o mesmo, sendo o progenitor a principal fonte da agressividade do protagonista que mais tarde é canalizada no MMA. Esse conflito interno de Aldo é muito abordado durante a história e acaba complementando muito bem as cenas de ação.

A direção de Afonso Poyart acerta muito nas cenas de luta e na fotografia. Com uma alta dose de ação estilizada, que lembra muito Hollywood, em especial Zack Snyder, Poyart faz do exagero sua marca registrada, assim como já demostrara em 2 Coelhos. Porém, por se tratar de uma trama real, o diretor não usa tanto do estilismo usado no fantasioso 2 Coelhos. Mesmo assim ele não abre mão do uso do slow motion, das cores vibrantes na fotografia e da utilização de animações, porém tudo em menor escala quando comparado ao filme que o tornou famoso. Apesar do exagero ser o grande trunfo de Poyart, ele também pode ser considerado em certos momentos um defeito. Há alguns momentos em que a estilização não se encaixa na cena, como em algumas cenas dramáticas em que o uso do exagero não cai muito bem, em que um silêncio ou uma sobriedade seriam melhores. Mesmo assim, se considerarmos o todo, a direção e a fotografia são extremamente competentes em entreter, provocar sensações nos expectadores e ambientá-los naquele universo.

Quanto as atuações, no geral são muito boas. José Loreto surpreende ao mostrar uma atuação competente no papel de José Aldo. Além disso, sua caracterização está excelente, o ator que é branco, alto e de olhos claros, está parecido com o lutador que é moreno e baixo. A maquiagem que o deixou com a pele mais escura, as lentes para esconder os olhos claros e os truques de câmera para deixa-lo mais baixo, ajudam a tornar a performance de Loreto mais crível.

Quanto ao restante do elenco, os destaques ficam por conta de Jackson Antunes, Claudia Ohana e Milhen Cortaz. Os dois primeiros que interpretam respectivamente o pai e a mãe de Aldo, conferem um peso dramático muito forte para a narrativa. Ohana está muito bem como a mulher sofredora e simplória, e Antunes apesar de estar repetindo o papel que já fez tantas vezes em novelas da Globo, atua bem como o sujeito bruto, simples e rústico. Quanto a Cortaz, o ator tem uma atuação firme e realista, carregando bem o papel do treinador duro, porém apoiador.

Rafinha Bastos é uma grata surpresa no papel do amigo que recebe Aldo no Rio de Janeiro. Apesar de parecer muitas vezes estar interpretando ele mesmo, com diálogos que mais parecem um texto de stand up comedy, Bastos cumpre bem o seu papel de alívio cômico, com uma interpretação bem natural e que arranca boas risadas da audiência. A única interpretação que fica um pouco abaixo das demais é a de Cléo Pires no papel do par romântico de Aldo. A atriz não convence como lutadora, muito menos como amada do protagonista, sua atuação soa um pouco superficial, fica na cara que ela está interpretando, não aparenta ser real.

Há ainda um componente metafórico muito interessante no filme. Não vou me alongar para não dar nenhum spoiler, mas fica evidente durante o filme que Aldo tem uma luta interna muito forte, talvez até mais forte do que contra os seus adversários. Como o próprio título do longa diz, o lutador é “Mais Forte Que o Mundo”, sendo assim nada pode derrota-lo, exceto ele mesmo. O filme abusa de metáforas para mostrar esse conflito interno de Aldo, essa luta contra ele mesmo é mostrada de forma que o expectador não sabe direito o que é real e o que está na cabeça do lutador, assim como o protagonista também fica confuso com os seus fantasmas.

Por fim, Mais Forte Que o Mundo: A História de José Aldo, é um filme divertido, com boas cenas de luta, mas que também não abre mão do drama. A direção de Poyart é algo diferente do que vemos atualmente no cinema nacional, o seu estilo Hollywoodiano certamente agradará os amantes do cinema americano. O fãs de luta, em especial do MMA, também ficarão satisfeitos com as boas sequências de luta estilizadas. Resumindo, o longa agradará certamente que gosta de um bom blockbuster de ação, mas também agrada quem busca uma história mais trabalhada com uma boa dose de drama e simbolismo.







sexta-feira, 24 de junho de 2016

Festa de Família (1998)




Primeiramente é bom falar que Festa de Família é um filme representante do movimento cinematográfico conhecido como Dogma 95. O movimento criado pelos dinamarqueses Thomas Vinterberg e Lars Von Trier, tinha como regras a “busca por um cinema mais puro”, menos comercial e sem o uso de tantos artifícios técnicos. Para se ter uma ideia, o Dogma 95 não permitia que se usasse luz artificial, trilha sonora e efeitos visuais. Além disso, a filmagem deveria ser feita com a câmera na mão.

Resumindo, o Dogma 95 pregava um cinema feito de forma simples, em que a história deveria se sustentar sozinha. E é aí que está o grande trunfo de Festa de Família, o filme tem uma trama muito forte e impactante que prende a atenção do expectador apesar da discutível qualidade audiovisual.

O longa dirigido por Thomas Vinterberg conta a história de uma rica família dinamarquesa que se reúne na mansão do patriarca para celebrar o seu 60° aniversário. No entanto, a festa que tinha tudo para ser alegre e divertida ganha contornos de drama quando o filho Christian acusa o pai de ter molestado ele e a irmã quando crianças. A partir desse momento uma série de acontecimentos chocantes passa ocorrer e a família fica dividida entre o clima tenso da revelação de Cristian e o clima festivo do aniversário do pai.
Festa de Família é provavelmente o melhor filme do Dogma 95 por dois motivos: 1° o roteiro é muito bom e impactante, 2° o estilo simples de filmagem do Dogma 95 se encaixa muito bem com a história. Apesar da qualidade imagética estar longe de ser bela, a filmagem simples dá ao filme um tom de filme festivo familiar, quase como se um membro da família estivesse operando a câmera para gravar para a posteridade a reunião de família. De certa forma o estilo Dogma 95 passa uma maior veracidade para a história, complementando muito bem o roteiro.
Apesar do estilo de filmagem mais “cru”, Vinterberg trabalha muito bem os enquadramentos e os movimentos de câmera. O diretor se mostra arrojado ao conseguir criar tensão mesmo com poucos recursos técnicos. A cena da filha do Patriarca, Helene, se sentindo aterrorizada por um suposto fantasma da irmã no quarto é muito inteligente, utilizando da câmera subjetiva e do jogo de “mostra – não mostra” para criar tensão.

Quanto as atuações, estas são extremamente competentes. O clima tenso e desconfortável do filme, vem muito das interpretações. Como se trata de uma história sobre uma família dinamarquesa, é de se esperar relações mais frias e impessoais, característica dos povos escandinavos. Os atores cumprem muito bem o papel de passar essa frieza, mesmo, no entanto, o grande trunfo das suas interpretações está na quebra dessa impessoalidade, nos momentos de raiva, de tristeza e de embate. Os destaques ficam por conta de Ulrich Thomsen, no papel do filho Christian, Henning Moritzen como o pai Helge e Thomas Bo Larsen como o irmão mais novo de Christian, Michael.

Por fim, Festa de Família é um filme extremamente simples tecnicamente, porém extremamente bem escrito e dirigido. O estilo de filmagem “sem firulas” do Dogma 95 casa muito bem com a proposta do filme, mostrar a família tradicional além das aparências, mostra-la de dentro, sem filtros, da forma mais realista possível. O filme recebeu grande reconhecimento da crítica internacional, tendo vencido o conceituado prêmio do júri do Festival de Cannes. Portanto, se você está à procura de um filme realista, impactante e sem distrações técnicas, Festa de Família é uma boa pedida!





quarta-feira, 22 de junho de 2016

Tudo Sobre Vincent (2016)


Em exibição nos cinemas com uma programação mais cultural, Tudo Sobre Vincent é uma espécie de filme não convencional de super-herói. O longa se vende no trailer como o “1° filme de super-herói francês”, mas com um importante adendo: “sem efeitos especiais”.  Essa frase resume bem o que é o filme, que está longe de ser um filme de herói Hollywoodiano, mas também não chega a ser um tradicional filme de arte francês. Na verdade, Tudo Sobre Vincent fica no meio do caminho, a melhor definição para o longa talvez seria a de “filme cult de super-herói.

A história gira em torno de Vincent (Thomas Salvador), um sujeito introspectivo e recluso que trabalha como pedreiro, que vê sua vida mudar quando descobre que adquire uma super força quando está contato com a água. Se não bastasse a natureza no mínimo esquisita dos poderes de Vincent, o mesmo não chega a usar o seu “dom” para combater o crime, como nos filmes de super-herói americanos, pelo contrário, Vincent tem medo dos poderes, e os esconde como se fossem uma doença.

Se não bastasse a estranheza do mote principal da história, o filme é de certa forma “esquisito” em outros aspectos. A começar pelo protagonista, que tem pouquíssimas falas e age de maneira no mínimo peculiar. Vincent é um cara “travado”, sem expressão, sem vivacidade, sem sonhos e nem aspirações, uma representação exagerada do “loser” dos filmes americanos. Outro exagero aparente está nas situações de perigo do filme, especialmente no clímax, quando um simples ato toma proporções catastróficas.

Devido a esse aspecto mais absurdo, o filme pode ser entendido como uma grande metáfora. Vincent é um homem fraco em todos sentidos, profissionalmente, fisicamente e emocionalmente, e passa a ter poderes quando está molhado pela água, especialmente quando está nadando sozinho em um lago.  Ou seja, quando está sozinho ele é forte.  O lago pode ser entendido como um momento de reflexão do protagonista, em que ele só está em contato consigo mesmo e se sente forte por ninguém poder oprimi-lo naquele momento. Resumindo, Vincent se sente forte quando não está vivendo a sua “vida medíocre”, quase como se fosse um mundo imaginário em que ele é um super-herói.

No entanto, o protagonista sente medo de mostrar a sua força. Ele esconde de todos ao seu redor os poderes que poderiam torna-lo famoso. É como se ele fosse reprimido a mostrar a sua força, como se existisse uma espécie de barreira emocional que não deixasse ele mostrar o seu valor, suas qualidades.

Percebe-se então que além do caráter metafórico, o filme também possui uma certa sátira aos filmes de super-herói tradicionais. O longa brinca de desconstruir o velho cliché de filme de super-herói: O homem fraco que passa a ter poderes e vê sua vida se transformar totalmente. A exemplo do nerd Peter Parker, e do “magrelo” Steve Rodgers, Vincent é um “loser” que ganha poderes. No entanto, diferente dos filmes da Marvel, Vincent não tem grandes embates contra vilões que querem dominar o mundo e nem é adorado pelo povo, seu drama é pessoal, introspectivo.

Assim como o Peter conquista Mary Jane, Vincent também se envolve com uma mulher teoricamente longe do seu alcance. Assim como a ruiva das histórias do Homem Aranha, Lucie é completamente o oposto do protagonista. Enquanto Vincent é introspectivo, ela é extremamente extrovertida e popular. O filme brinca bastante com mais esse cliché das histórias de super-herói: o fracassado que namora a “garota dos sonhos”. Apesar de Lucie não ser tão bonita quanto Mary Jane, na vida real seria muito difícil a mesma se interessar por um cara como Vincent. Outro ponto interessante é que o filme exagera a forma como os dois ficam juntos, se nos filmes de super-herói a garota passa a se interessar pelo protagonista de forma gradual, em Tudo Sobre Vincent é o oposto. Lucie se interessa logo de cara por Vincent e praticamente “se joga” em cima dele, apesar das aparentes inabilidades amorosas do protagonista.

O filme francês apresenta ao longo da história uma série de quebras de expectativas de coisas que usualmente aconteceriam em filmes de heróis. Como por exemplo o protagonista começar a combater o crime ou então dar aquele beijo cinematográfico na garota. Há uma cena claramente parodiada do filme do Homem Aranha, em que Peter de ponta cabeça beija Mary Jane na chuva. No filme francês é Lucie que está de ponta cabeça esperando um beijo de Vincent que não acontece, mostrando que esse é um filme de herói diferente.

Resumindo, Tudo Sobre Vincent é uma interessante e divertida sátira dos filmes de super-herói de Holiwood, com uma boa dose de um exagero proposital e metafórico. Portanto, se você estiver afim de algo diferente o longa francês é uma boa pedida!

quarta-feira, 15 de junho de 2016

Assassinos por Natureza (1994)


Dirigido por Oliver Stone e estrelado por Woody Harrelson, Juliette Lewis, Robert Downey Jr e Tommy Lee Jones, o filme conta a história do casal de assassinos Mickey Knox (Harrelson) e Mallory Knox (Lewis). Após cometerem uma série de assassinatos por todo o país, os matadores se tornam verdadeiras celebridades do crime depois de ampla cobertura da mídia sensacionalista.

Um fato interessante é que o roteiro do longa foi escrito por Quentin Tarantino, que como de costume “caprichou” na violência, que é o tema central da narrativa. Um olhar mais desatento pode classificar o filme como apenas mais uma produção estadunidense violenta. Mas se analisado de maneira mais crítica, percebe-se que Assassinos por Natureza é na verdade uma bela crítica a banalização da violência. O longa usa muito da “violência tarantinesca” para satirizar a normalidade que a mesma adquiriu nos dias de hoje. Atualmente devido à grande exposição de conteúdo violento a que somos expostos a violência não impacta tanto. Filmes, jogos de vídeo game, desenhos e o noticiário policial transformaram o expectador mais tolerante a violência.

O filme brinca muito com essa glamourização da violência. Seja através de cenas de assassinato exageradas com muito sangue, seja através da glorificação que os protagonistas recebem pelos seus atos criminosos. Na história, o casal Knox passa a receber grande cobertura da mídia policial que acaba os alçando a categoria de celebridades. Assim como ocorreu na vida real com Charles Manson e outros famosos serial killers americanos, que passaram a ser venerados por uma legião de fãs.

Outra forma muito inteligente que o filme satiriza a violência é através da mistura de linguagens audiovisuais. Existe uma grande variação de estilos de filmagem, passando pelo documentarista, linguagem de vídeo clipe, sitcom, desenho animado e jornalismo televisivo. Ao misturar todas essas linguagens distintas, Assassinos por Natureza diz em forma metafórica que a violência está em todos os meios audiovisuais, desde o desenho do Tom e Jerry até o programa do Datena. E essa presença massiva da violência é explicada segundo o filme por um simples motivo: O ser humano é naturalmente violento e sente um certo prazer ao visualizar a agressividade. O próprio protagonista Mickey Knox diz em uma cena que ele gosta de matar porque o homem é por natureza assassino, sempre matamos uns aos outros ao longo da história da humanidade, seja através de guerras ou por meros motivos banais. Então, pela lógica do filme, se o homem não mata de fato, ele vai satisfazer seu instinto assassino através de conteúdo violento.

Além da crítica inteligente, o filme conta com grandes atuações. Wood Harrelson e Julliete Lewis estão muito bem como o casal assassino. Eles fazem uma espécie de versão moderna de Bonnie e Clyde, carismáticos ao extremo mesmo sendo criminosos. Harrelson, como de costume está ótimo como o cara pirado e totalmente sem limites. Já Lewis, que já demostrara grande talento ainda jovem em Cabo do Medo, mostra que definitivamente é uma ótima atriz, com uma interpretação ao mesmo insana e carismática.

O restante do elenco também está excelente. Downey Jr interpreta muito bem o jornalista sensacionalista, ao mesmo tempo cômico e lunático. Tommy Lee Jones, apesar do pouco tempo de tela marca presença, dando vida a um diretor de penitenciaria pirado. Outro que tem bastante destaque é Tom Sizemore, que vive Jack Scagnetti, um detetive policial narcisista e de métodos pouco ortodoxos, o ator passa muito bem todo o narcisismo e agressividade do personagem.

Resumindo, Assassinos por natureza é um filme que têm grande valor de entretenimento ao mesmo tempo em que faz uma crítica inteligente. O longa tem personagens carismáticos e uma mistura de linguagens visuais muito interessante. Se você gosta da violência dos filmes  o Tarantino mas não abre mão de uma boa dose de experimentalismo e crítica social, Assassino por natureza é uma boa pedida




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sexta-feira, 10 de junho de 2016

São Paulo, Sociedade Anônima (1965)



Dirigido por Luís Sergio Person e protagonizado por Walmor Chagas, São Paulo, Sociedade Anônima se passa na capital paulista durante o “boom “ industrial no Brasil. O filme narra a história de Carlos (Walmor Chagas), um típico paulistano de classe média com um bom emprego, que anseia por subir na vida ao mesmo tempo em que se sente desconfortável com o ritmo alucinante e impessoal da grande metrópole.

O longa serve de retrato histórico da São Paulo da época, são mostrados em vários momentos locais conhecidos pelos paulistanos, como edifícios famosos, ruas, avenidas e praças, além de eventos tradicionais da cidade como a corrida de São Silvestre. Além desse lado mais documental, o filme aborda muito bem a narrativa do homem que é “engolido” pela cidade grande. Carlos é quase que a representação de São Paulo em forma de pessoa, o protagonista é um sujeito individualista, egoísta e ambicioso, que trata as pessoas de forma impessoal.

O personagem é um conquistador, tem várias mulheres, mas não é feliz com nenhuma delas, as trata como mercadoria e não consegue se realizar nem com os casos amorosos e nem com a bem-sucedida carreira profissional. Ao mesmo em que faz parte do “organismo da metrópole”, Carlos se sente sufocado por ela. Percebe-se neste ponto uma certa semelhança entre o protagonista do filme e Don Draper, protagonista da série americana Mad Man:  ambos são contemporâneos, vivem em grandes cidades, tem bons empregos e possuem sucesso com as mulheres, mas apesar de tudo isso são infelizes e rejeitam internamente o ambiente capitalista que os moldou como modelos de homem de sucesso.

Apesar de focar no drama de Carlos, os outros personagens do filme também são exemplos de “crias” da cidade grande. O chefe do protagonista, Arturo, é um imigrante italiano que prosperou em São Paulo, exemplo do “self made man”, ele obteve sucesso profissional ao abrir uma fábrica de autopeças, as custas de subornos, exploração dos trabalhadores e outras falcatruas. Há também as “mulheres de Carlos”, que também se encaixam nos estereótipos da grande metrópole. Ana é ambiciosa e almeja enriquecer graças a sua beleza, seja trabalhando como garota propaganda, seja dando em cima do industrial Arturo. Já Luciana é o exemplo de mulher que tem como objetivo de vida conseguir um bom casamento, sem ter tido uma boa educação sua perspectiva de sucesso reside em constituir uma família com um homem que a proporcione uma boa situação.

Quanto a direção, Person se preocupa bastante em ambientar o expectador na “correria” paulistana. O protagonista é mostrado em diversas cenas andando pelas ruas abarrotadas de pessoas apressadas, como se fosse apenas mais um habitante entre tantos paulistanos. Carlos se sente deslocado em vários momentos, e a câmera do diretor consegue captar isso muito bem. Ora o protagonista aparenta estar desorientado em meio à multidão, ora ele se sente sufocado pela grandeza da cidade, como por exemplo quando os imensos arranha céus são filmados de baixo para cima, dando a sensação de inferioridade do indivíduo frente a cidade. Este é outro ponto positivo da direção de Person, a cidade é mostrada como grandiosa, esplendorosa, porém impiedosa e as vezes até cruel. Como diz o título do filme, São Paulo é na ótica do diretor uma grande indústria, bem-sucedida, porém impessoal, e esse aspecto acaba refletindo no comportamento dos seus habitantes.

Sobre as atuações, não temos nenhuma excepcional, mas em geral são muito competentes. Walmor Chagas é sem dúvida o grande destaque, não apenas por ser o protagonista e aparecer em quase todas as cenas, como também por ter a atuação mais sólida e verdadeira do filme, suas angustias são muito bem transmitidas ao expectador. Outros destaques, são Otello Zeloni, no papel de Arturo e a jovem Eva Wilma como Luciana. O primeiro consegue passar muito bem toda a malandragem cômica de Arturo, enquanto a segunda faz muito bem a recatada moça de família. Há ainda algumas atuações exageradas e um pouco fora de tom, como por exemplo as de Darlene Glória como Ana e Ana Esmeralda como Hilda, mas nada que comprometa a qualidade do filme.

Ainda sobre os excessos, há alguns diálogos um pouco exagerados. Além da narração em off do protagonista, que é em certos momentos excessiva e um pouco maçante, mas é necessária a narrativa, se levado em conta que o filme deseja entrar na cabeça de Carlos e mostrar ao expectador os seus dramas e dilemas.

Por fim, São Paulo, Sociedade Anônima é um verdadeiro clássico do cinema nacional, seja pelo belo retrato histórico de São Paulo, seja pela forma como é mostrado a cidade grande sufocando o indivíduo. O filme capta muito toda a grandeza e impessoalidade de São Paulo, através das tomadas inteligentes de Person e da boa atuação de Chagas. O longa foi premiado internacionalmente, tendo recebido o prêmio do público na Mostra Internacional do Novo Cinema de Pesaro (Itália) e o Prêmio Cabeza de Palenque do Festival de Acapulco (México). É, portanto, um filme destinado aos amantes do bom cinema brasileiro, bem como do cinema reflexivo e de crítica social.





quinta-feira, 9 de junho de 2016

Os 5+: Filmes de Boxe



A exemplo do futebol americano, o boxe é um esporte que sempre rendeu excelentes filmes. Muito devido a sua popularidade nos EUA, Hollywood sempre se interessou por contar histórias de boxeadores e mostrar nas telonas o que só se via nos ringues. Seja pela narrativa em que o boxe serve de metáfora para as batalhas da vida, seja pelo simples prazer de se ver uma emocionante luta, é difícil encontrar alguém que não goste de filmes de boxe, mesmo quem não é fã do esporte.
Separamos para você quais são na nossa opinião os melhores filmes do gênero. Confira!:



5° A Luta pela Esperança (2005)


Dirigido por Ron Howard e protagonizado por Russel Crowe, que já haviam trabalhado juntos no bem-sucedido Uma Mente Brilhante, A Luta pela Esperança narra a história real do boxeador James J. Braddock, que luta para voltar aos ringues ao mesmo tempo em que tem de lidar com a pobreza causada pela depressão de 1929. Além de ter excelentes cenas de lutas, o longa conta com um grande componente dramático, que engrandece e torna a história ainda mais emocionante. De quebra o filme também tem uma bela atuação do grande Russel Crowe, além de uma excelente interpretação de Paul Giamatti que chegou até a ser indicado ao Oscar de melhor ator coadjuvante.
O filme foi indicado a 3 Oscars, 2 Globos de Ouro, 1 BAFTA e 2 SAGs, tendo vencido o SAG de melhor ator coadjuvante.




4° O Vencedor (2010)


Dirigido por David Russel e protagonizado por Mark Wahlberg, Christian Bale e Amy Adams, o filme conta a história real do pugilista Mick Ward (Wahlberg) e seu irmão Dick Eucklund (Bale). Ward sonha em se tornar campeão mundial, e para isso conta com a ajuda do irmão que já foi um grande lutador e inclusive nocauteou Sugar Ray Leonard, mas entrou em declínio devido ao seu vício em crack. A doença do irmão e problemas com o restante da família tornam o sonho de Ward algo mais distante, no entanto ao começar um relacionamento com Charlene Fleming (Adams), o boxeador decide se focar para buscar o sonhado cinturão.
Além de boas cenas de luta, o filme tem uma grande história de superação, tanto de Ward, quanto do seu irmão. Mas os destaques do longa ficam por conta das brilhantes atuações de Christian Bale e Melissa Leo( como a mãe de Ward) sendo que ambos receberam o Oscar pelas interpretações. A performance do ator galês ficou marcada pela impressionante transformação física, Bale emagreceu a ponto de ficar irreconhecível, se assemelhando muito a um usuário de crack



3° Menina de Ouro (2004)


Dirigido por Clint Eastwood e estrelado por Hilary Swank, o filme conta a história de Maggie Fitzgerald (Swank), uma boxeadora talentosa treinada pelo carrancudo Frankie (Eastwood). Tudo parece ir bem até que Maggie sofre um duro golpe da vida (não vou me alonga nessa parte para evitar spoilers).
Esse é sem dúvida o filme mais emocionante e triste dessa lista, que além da grande direção e atuação de Eastwood, conta com uma primorosa interpretação da Hillary Swank, que já havia demostrado grande talento anteriormente no excelente “Meninos Não Choram”.
O longa venceu 4 Oscars, nas categorias Melhor Filme, Melhor Direção, Melhor Atriz (Swank) e Melhor Ator Coadjuvante (Morgan Freeman). Além de 2 Globos de Ouro e 2 SAGs.





2° Franquia Rocky


Pensar em filme de boxe sem pensar em Rocky é impossível. A franquia de Silvester Stallone marcou época e popularizou de vez o pugilismo no cinema. Os filmes se tornaram extremamente marcantes, pela alta dose de lutas memoráveis, e pela bela história de superação e momentos que ficaram imortalizados na cultura pop (como por exemplo as cenas da escadaria, do treinamento com a carne e a famosa fala: “Adrian!!!”).
Rocky é sem dúvida a representação mais memorável do boxe em termos de espetáculo nas telonas. O espírito dos ringues foi fielmente transportado para o cinema através de Stallone.
O primeiro filme da série, “Rocky, um Lutador”, conquistou a incrível façanha de receber o Oscar de Melhor Filme e Melhor Diretor, além de 1 Globo de Ouro.




1° Touro Indomável



Se Rocky transportou o espetáculo dos ringues para o cinema, Touro Indomável trouxe as telas um aspecto mais cru e violento do esporte. Reconhecido em várias listas, como um dos maiores filmes da história, o longa transcende o gênero de filme esportivo, se tornando um exemplo de excelência como filme de drama e também de cinema de arte. A fotografia em preto e branco, as grandes lutas, a brilhante direção de Scorsese e a estupenda atuação de De Niro, fazem da adaptação da história real do boxeador Jake LaMotta no melhor filme de boxe da história do cinema.

Touro Indomável foi agraciado com 2 Oscars, Melhor Ator (De Niro) e Melhor Edição, além de 2 BAFTAS e 1 Globo de Ouro


segunda-feira, 6 de junho de 2016

Ponto Zero


Em cartaz nos cinemas, Ponto Zero é uma grata surpresa aos cinéfilos e um belo exemplo de um filme nacional com uma estética brilhante e inovadora. Filmado no Rio Grande do Sul, o filme é dirigido por José Pedro Goulart e protagonizado pelo estreante Sandro Aliprandini, que vive Ênio, um garoto que passa pela conturbada fase da puberdade ao mesmo tempo em que tem de lidar com uma família disfuncional.

Basicamente o filme trata do processo de amadurecimento, da formação da personalidade, do estabelecimento do “Ponto Zero” da vida adulta. Mas o filme vai muito além de apenas contar os dramas da adolescência, a narrativa é repleta de metáforas e simbolismos. Esse é o grande trunfo do longa, essa árdua etapa da vida dos jovens é mostrada de forma
 alegórica, através de inteligentes metáforas visuais, e representações simbólicas. Várias cenas representam o sentimento de deslocamento de Ênio, como por exemplo em vários momentos em que as coisas são mostradas invertidas, como carros andando para trás em uma avenida no céu. Há ainda uma cena em que o garoto anda de bicicleta sem ser visto por ninguém, evidenciando que ele se vê invisível frente aos outros.


O poder e o impacto dessas metáforas são realçados ainda mais pela brilhante fotografia e pelos enquadramentos inteligentes. As imagens são belíssimas, de encher os olhos, como há muito tempo não se via no cinema nacional. Quanto a direção de Goulart, esta é muito perspicaz em mostrar os personagens sempre distantes, a família de Ênio está longe de ser unida, seu pai e sua mãe vivem sempre brigando e o garoto tem problemas para se relacionar com eles. O diretor evidencia essa distância, através de tomadas em que os personagens estão sempre longe um do outro, seja através de uma câmera na janela quando a mãe observa o marido e o filho, seja mostrando apenas as vozes dos pais discutindo ou então através do silêncio desconfortável nos jantares em família.

As atuações também cumprem bem o seu papel de adicionar dramaticidade a narrativa. Aliprandini convence bem como um garoto em fase de descobrimento, sua interpretação é muito natural e introspectiva, e apesar das poucas falas consegue passar muito bem os seus dramas internos. Seus pais também estão muito bem, o pai, interpretado por Eucir de Sousa faz muito bem o papel de homem grosseiro e bruto que deixa a família em segundo plano, enquanto a mãe, Patrícia Selonk, passa bastante sofrimento no papel da mulher do lar que se vê desamparada pelo marido.

Por fim, é bom frisar que o filme tem um ritmo lento e contem poucas falas, a história é contada primordialmente através de imagens, o que pode ser um problema para quem é habituado a longas mais acelerados e com mais ação. No entanto, o filme está longe de ser maçante, apesar do ritmo mais devagar Ponto Zero tem uma boa narrativa e consegue prender o expectador através de belas imagens e de cenas angustiantes e dramáticas. Outro ponto que se deve ter em mente antes de assistir ao filme, é a sua natureza metafórica. Se interpretado de forma literal o longa pode parecer confuso ou sem graça, mas se levado em conta o seu simbolismo a obra se torna riquíssima e a experiência do expectador será certamente gratificante.

Resumindo, Ponto Zero, é um filme 
poético, com uma grande qualidade imagética e que proporciona uma visão profunda das transformações da adolescência. É muito fácil se identificar com o protagonista, pois todo mundo já passou ou está passando por essa fase. A história em si pode não ser muito complexa, mas é muito real, e associada as atuações, fotografia, trilha sonora e direção tornam o longa metragem mais um representante do bom cinema brasileiro. Portanto, se você é um amante da sétima arte e deseja conhecer mais as boas obras tupiniquins, corre para a sala de cinema mais próxima e confira Ponto Zero!

Trailer: