sexta-feira, 10 de junho de 2016

São Paulo, Sociedade Anônima (1965)



Dirigido por Luís Sergio Person e protagonizado por Walmor Chagas, São Paulo, Sociedade Anônima se passa na capital paulista durante o “boom “ industrial no Brasil. O filme narra a história de Carlos (Walmor Chagas), um típico paulistano de classe média com um bom emprego, que anseia por subir na vida ao mesmo tempo em que se sente desconfortável com o ritmo alucinante e impessoal da grande metrópole.

O longa serve de retrato histórico da São Paulo da época, são mostrados em vários momentos locais conhecidos pelos paulistanos, como edifícios famosos, ruas, avenidas e praças, além de eventos tradicionais da cidade como a corrida de São Silvestre. Além desse lado mais documental, o filme aborda muito bem a narrativa do homem que é “engolido” pela cidade grande. Carlos é quase que a representação de São Paulo em forma de pessoa, o protagonista é um sujeito individualista, egoísta e ambicioso, que trata as pessoas de forma impessoal.

O personagem é um conquistador, tem várias mulheres, mas não é feliz com nenhuma delas, as trata como mercadoria e não consegue se realizar nem com os casos amorosos e nem com a bem-sucedida carreira profissional. Ao mesmo em que faz parte do “organismo da metrópole”, Carlos se sente sufocado por ela. Percebe-se neste ponto uma certa semelhança entre o protagonista do filme e Don Draper, protagonista da série americana Mad Man:  ambos são contemporâneos, vivem em grandes cidades, tem bons empregos e possuem sucesso com as mulheres, mas apesar de tudo isso são infelizes e rejeitam internamente o ambiente capitalista que os moldou como modelos de homem de sucesso.

Apesar de focar no drama de Carlos, os outros personagens do filme também são exemplos de “crias” da cidade grande. O chefe do protagonista, Arturo, é um imigrante italiano que prosperou em São Paulo, exemplo do “self made man”, ele obteve sucesso profissional ao abrir uma fábrica de autopeças, as custas de subornos, exploração dos trabalhadores e outras falcatruas. Há também as “mulheres de Carlos”, que também se encaixam nos estereótipos da grande metrópole. Ana é ambiciosa e almeja enriquecer graças a sua beleza, seja trabalhando como garota propaganda, seja dando em cima do industrial Arturo. Já Luciana é o exemplo de mulher que tem como objetivo de vida conseguir um bom casamento, sem ter tido uma boa educação sua perspectiva de sucesso reside em constituir uma família com um homem que a proporcione uma boa situação.

Quanto a direção, Person se preocupa bastante em ambientar o expectador na “correria” paulistana. O protagonista é mostrado em diversas cenas andando pelas ruas abarrotadas de pessoas apressadas, como se fosse apenas mais um habitante entre tantos paulistanos. Carlos se sente deslocado em vários momentos, e a câmera do diretor consegue captar isso muito bem. Ora o protagonista aparenta estar desorientado em meio à multidão, ora ele se sente sufocado pela grandeza da cidade, como por exemplo quando os imensos arranha céus são filmados de baixo para cima, dando a sensação de inferioridade do indivíduo frente a cidade. Este é outro ponto positivo da direção de Person, a cidade é mostrada como grandiosa, esplendorosa, porém impiedosa e as vezes até cruel. Como diz o título do filme, São Paulo é na ótica do diretor uma grande indústria, bem-sucedida, porém impessoal, e esse aspecto acaba refletindo no comportamento dos seus habitantes.

Sobre as atuações, não temos nenhuma excepcional, mas em geral são muito competentes. Walmor Chagas é sem dúvida o grande destaque, não apenas por ser o protagonista e aparecer em quase todas as cenas, como também por ter a atuação mais sólida e verdadeira do filme, suas angustias são muito bem transmitidas ao expectador. Outros destaques, são Otello Zeloni, no papel de Arturo e a jovem Eva Wilma como Luciana. O primeiro consegue passar muito bem toda a malandragem cômica de Arturo, enquanto a segunda faz muito bem a recatada moça de família. Há ainda algumas atuações exageradas e um pouco fora de tom, como por exemplo as de Darlene Glória como Ana e Ana Esmeralda como Hilda, mas nada que comprometa a qualidade do filme.

Ainda sobre os excessos, há alguns diálogos um pouco exagerados. Além da narração em off do protagonista, que é em certos momentos excessiva e um pouco maçante, mas é necessária a narrativa, se levado em conta que o filme deseja entrar na cabeça de Carlos e mostrar ao expectador os seus dramas e dilemas.

Por fim, São Paulo, Sociedade Anônima é um verdadeiro clássico do cinema nacional, seja pelo belo retrato histórico de São Paulo, seja pela forma como é mostrado a cidade grande sufocando o indivíduo. O filme capta muito toda a grandeza e impessoalidade de São Paulo, através das tomadas inteligentes de Person e da boa atuação de Chagas. O longa foi premiado internacionalmente, tendo recebido o prêmio do público na Mostra Internacional do Novo Cinema de Pesaro (Itália) e o Prêmio Cabeza de Palenque do Festival de Acapulco (México). É, portanto, um filme destinado aos amantes do bom cinema brasileiro, bem como do cinema reflexivo e de crítica social.





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